segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Hospital dos Horroris


Não pode ficar pior do que já estar, certo? Acho que todas as pessoas do mundo já pensaram nisso algum dia na vida. Certa tarde eu estava em quarto de albergue em uma cidadezinha no meio da Patagônia, estava no final da tarde e o quarto começa a ficar mais frio, Mayra estava dentro do banheiro tomando banho e Rafael Lindoso estava lendo alguma coisa sobre Dinossauros. Ronny e Flavinha, jogavam ping-pong com alguns argentinos em uma sala do albergue separada para recreação. “esse quarto ta frio pra caramba, essa porra desse aquecedor não esta esquentando nada” eu pensei. Levanto-me da cama e vou até o aquecedor, ponho a mão nele e percebo que quase não esquentava. Vou falar com alguém do albergue pra ver isso. Chego à recepção e informo sobre o problema e a recepcionista chamada Guadalupe, que liga pra alguém pra da uma olhada no aquecedor do nosso quarto. Eu resolvo então sentar na frente de um dos computadores com acesso a internet que o albergue disponibilizava para os alberguistas. Os computadores ficavam em um corredor entre um terraço e uma sala, e todas as vezes que alguma pessoa passava para o terraço ou para a sala, abria uma porta que sempre entrava um vento muito frio, eu de short e camisa, sentia minhas canelas ficarem geladas, mais um determinado momento eu começo a sentir um mal estar no corpo, “não pode ficar pior do que já estar, certo?” foi o que eu pensei. Só pra se ter uma idéia do por que eu pensei nisso, basta informar que eu tinha sacado todo o meu dinheiro em Buenos Aires e colocado na minha carteira, sendo que depois de uma viagem de metrô eu percebi que estava sem carteira, sem dinheiro e sem documentos em outro país, essa história já foi contada aqui nesse blog com o título: Buenos Aires. Eu me levanto e retorno ao quarto, ao entrar percebo um argentino tentando concertar o aquecedor, deito na cama e Rafael Lindoso continua lendo alguma coisa sobre Dinossauros. O Argentino diz que não tem como concertar, maravilha, o albergue está lotado e agente não tem como mudar de quarto. A Mayra sai do banheiro e pergunta:
- Ta sentindo alguma coisa?
- Nada não.
Eu estava sentindo apenas uma dor muito grande dentro do meu pulmão todas as vezes que eu respirava; “que porra é essa?” eu pensei. Ronny retorna do ping-pong junto com Flavinha, nessa noite todos se preparam para conhecer a noite em Neuquém. Mais eu estava com um pressentimento que a noite não seria uma das melhores. Todos começam a se arrumar e eu continuo deitado, sentindo muito frio nas pernas e muita dor ao respirar.
- Emílio tu ta sentindo alguma coisa?
- Nada não.
Até que eu tento me levantar para tomar um banho, foi quando eu senti uma dor muito forte no pulmão outra vez; “puta que pariu, agora fudeu”. Deito na cama e olho para o teto, “não pode ficar pior do que já estar, certo?” Ronny e Flavinha já estão arrumados:
- Ei louco tu não vai não?
- Cara, acho que não.
- Por que?
- Eu acho que não to legal.
Depois que eu relatei o que eu sentia, todos viram que era melhor eu ficar, Mayra ficou comigo, alguns minutos depois, umas argentinas chegaram no albergue quando eu e Mayra estávamos na recepção relatando o meu estado e elas se ofereceram para me levar a um hospital. Eu aceitei. No banco traseiro daquele carro eu me senti confortável, não estava frio, o pulmão deu uma aliviada, acho que por causa da adrenalina, eu olhava as luzes passando, pessoas com traços no rosto diferente das pessoas da minha terra, mendigos bem agasalhados com roupas da Nike, “estranho isso”. O carro para e eu estou diante de um Hospital todo em mármore branco gelo, sou conduzido a uma sala onde parecia ser uma sala de espera, as pessoas que me deram carona falam em espanhol com uma mulher que parecia ser uma atendente, e eu fico ali sentado em um banco de madeira esperando, a mulher que me deu carona vai até mim e me diz que eles irão me chamar em alguns minutos, era só esperar agora; “não pode ficar pior do que já estar, certo? Afinal eu estou em um hospital” o tempo passa, e Mayra esta do meu lado e uma velha senhora argentina toda enrugada me chama atenção, seu semblante era de uma mulher que sofreu a vida inteira, “cara, a maior parte dos nordestino sobre no calor, e esse povo aqui sobre no frio, qual será o pior?” no meio dos meus pensamentos Mayra me chama:
- Emílio é tu, estão te chamando.
Eu me apresento e fico de pé ao lado da atendente, é quando chega um enfermeiro com uma cadeira de rodas e pede pra eu sentar.
- Eu estou bem. Posso ir andando.
- Não senhor, é o procedimento do hospital. Pacientes não podem andar dentro do hospital.
Eu sentei na cadeira e no início não gostei, da uma sensação de impotência, porra eu podia andar que procedimento é esse? O enfermeiro começa e subir alguns andares e Mayra não pôde ir comigo, procedimentos! O enfermeiro me coloca em uma maca em uma sala onde estão outros pacientes em outras macas, cada maca era coberta por um lençol branco em forma de curtina, eu sabia que tinha gente nas macas mais não conseguia ver o rosto de ninguém e eu fiquei ali sentado na maca, esperando. Só depois de um tempo eu percebi uma coisa que me chamou atenção, o local que eu estava tinha som, tocava tango argentino. “que porra é essa?” era um ambiente estranho e mais estranho ainda quando eu deitado na maca e percebo passar pessoas de branco com máscaras no rosto de um lado para o outro, eu só enxergava por entre as brechas do lençol que envolvia minha maca, mais com um detalhe, as pessoas que passavam de um lado para o outro, pareciam médicos e enfermeiros, com um detalhe, todos estavam ensangüentados. “Não pode ficar pior do que já estar, certo?” ficou, eu escuto gritos agonizantes e fico de espreita na brecha do lençol e vejo um cara gritando com a mão e parte do braço cheio de sangue e um dedo decepado, o cara gritava, os médicos corriam sujos de sangue, os pacientes nas macas ao meu lado imóveis e tocava tango. O médico finalmente chega, abri as curtinas e me examina. Disse que eu tinha princípio de “neumonia” que para o português significa, pneumonia, fechas as curtinhas e desaparece. Depois de algum tempo uma enfermeira abri as cortinas da minha maca e me da um aparelha para colocar no nariz. Eu recebo nebulização durante 50 minutos e vejo por entre as frestas da minha cortina, pacientes entrarem agonizando, ensangüentados, uma velha com uma perna muito enxada, um com um corte na cabeça muito profundo e tocando tango. “Que porra é essa? Parece que eu estou em um filme daqueles terrir, terror e comédia” me lembrei dos filmes trash que passava na TV bandeirantes e pensei se a moda pegasse no Brasil, em Salvador, qual seria a música dos pronto Socorros? “Segura o Tchan”? E em Belém? “quem vai querer a minha piriquita?”, depois da nebulização melhorou a dor que eu sentia no peito, os médicos me deram os remédios e eu comecei a me preocupar; “como é que eu vou pagar esse hospital?” o enfermeiro surge e me leva de volta até Mayra, e nessa hora eu pergunto a recepcionista:
- Quanto é que foi tudo?
- Aqui é um hospital público jovem.
- A ta, obrigado.
Voltamos para o albergue, dentro do quarto Rafael continua lendo alguma coisa sobre Dinossauros e me pergunta:
- E ai rapaz, o que deu lá?
- Eu to com um princípio de pneumonia.
Silêncio no quarto, e Rafael meio que sem jeito me pergunta:
- Isso é contagioso?

4 comentários:

  1. "- Ei louco tu não vai não?" isso é ronny falando, com certeza! kkkkk

    Bicho, se eu tivesse lá, saia correndo antes que tirassem o meu rim pro mercado negro. O hospital era público? Tá explicado: "El Soccorron"

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  2. Elemento, foi tudo não estranho que eu nem pensei nisso. rsrsr

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