sábado, 27 de novembro de 2010

Alunos Revoltados


“- Professor, o que é se masturbar?”
Uma aluna minha de 12 anos me fez essa pergunta essa semana, perguntas como essa e outras parecidas é muito comum para quem trabalha a matéria de Ciências na 7º série (8 ano) do Ensino Fundamental. Como responder? Ou melhor, como ser um bom professor? Muitos seguimentos da sociedade debate isso há muito tempo, acho que ao invés de procurar uma fórmula de como ser um bom professor, seria mais interessante o que fazer para não ser um “péssimo professor”. A meu pedido, alunos do 1º ano do Ensino Médio de uma das escolas que eu ministro aula elaboraram uma redação.
- Professor, é pra fazer uma redação sobre o que?
- Turma, escrevam quem são os seus melhores e os piores professores, e quais os motivos que levaram vocês chegarem as suas conclusões a respeito deles.
Se alguém não sabe o que fazer para ser um bom professor, acho que depois de ler o que esses alunos escreveram, da pra se ter uma idéia do que não fazer, para não ser considerado entre os piores professores.

“Ela tem um problema muito grande, passa um capítulo inteiro só de atividade, será que ela pensa que os outros professores não passam tarefa?”

“Só sabe falar da vida dela, será que ela não se toca que ninguém quer saber se falta ou não água na casa dela?”

“Nenhum professor pode fazer isso, ficar chamando os alunos de burros. O seu papel é ensinar e não ficar falando que somos burros.”

“Quando chega à sala só passa atividade”

“É muito ignorante”

“Começa a explicar de um jeito e termina explicando de outro que eu não consigo entender”

“Tem que mudar o jeito de se vestir, por que ela vem com umas camisas que não é brincadeira, em vez dos alunos prestarem atenção na aula, prestam atenção é na professora.”

“Faz confusão por assuntos mínimos”

“Ensina o assunto de uma forma que da vontade de dormi.”

“Não domina o assunto”

“Não consegue por ordem nos alunos”

“Falta um pouco mais de paciência com os alunos e às vezes tem que usar mais a educação.”

“Seus atos são muitos indisciplinares para uma professora que vem de favoráveis cursos e mestrados ao vir em roupas inadequadas e sua atitude de falar aos alunos com vaias, ou seja, ato que manda os alunos gritarem com os outros.”

“Uma pessoa bruta.”

“Não gosto dela por que ela fala mal do 1º ano para as outras turmas, se um aluno não sabe responder o que ela pergunta, ela sai falando mal desse aluno nas outras salas.”

“Chega à sala e não faz nada, só manda elaborar questões de cada capítulo, isso é chato.”

“Chegam à sala mal humorados e parece que estão sempre zangados, se eu tenho alguma dúvida em nem pergunto.”

“Não sabe explicar, só sabe é brigar com os alunos, coloca várias regras bestas nas suas aulas.”

“Fala muito baixo”

“Responde mal aos alunos e ainda manda as pessoas vaiarem quem respondeu mal”

“Muitas vezes eu volto para casa com tantas dúvidas...”

A receita de um bom professor muitos já deram, e essa receita nunca vai ficar pronta, pois já estaria na grade curricular de todos os cursos de licenciatura. Agora a receita de como se tornar um péssimo professor foi feita por alunos do 1º ano de uma escola pública do Ensino Médio, resta agora um professor ou um candidato a professor evitar os ingrendientes da receita acima.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Hospital dos Horroris


Não pode ficar pior do que já estar, certo? Acho que todas as pessoas do mundo já pensaram nisso algum dia na vida. Certa tarde eu estava em quarto de albergue em uma cidadezinha no meio da Patagônia, estava no final da tarde e o quarto começa a ficar mais frio, Mayra estava dentro do banheiro tomando banho e Rafael Lindoso estava lendo alguma coisa sobre Dinossauros. Ronny e Flavinha, jogavam ping-pong com alguns argentinos em uma sala do albergue separada para recreação. “esse quarto ta frio pra caramba, essa porra desse aquecedor não esta esquentando nada” eu pensei. Levanto-me da cama e vou até o aquecedor, ponho a mão nele e percebo que quase não esquentava. Vou falar com alguém do albergue pra ver isso. Chego à recepção e informo sobre o problema e a recepcionista chamada Guadalupe, que liga pra alguém pra da uma olhada no aquecedor do nosso quarto. Eu resolvo então sentar na frente de um dos computadores com acesso a internet que o albergue disponibilizava para os alberguistas. Os computadores ficavam em um corredor entre um terraço e uma sala, e todas as vezes que alguma pessoa passava para o terraço ou para a sala, abria uma porta que sempre entrava um vento muito frio, eu de short e camisa, sentia minhas canelas ficarem geladas, mais um determinado momento eu começo a sentir um mal estar no corpo, “não pode ficar pior do que já estar, certo?” foi o que eu pensei. Só pra se ter uma idéia do por que eu pensei nisso, basta informar que eu tinha sacado todo o meu dinheiro em Buenos Aires e colocado na minha carteira, sendo que depois de uma viagem de metrô eu percebi que estava sem carteira, sem dinheiro e sem documentos em outro país, essa história já foi contada aqui nesse blog com o título: Buenos Aires. Eu me levanto e retorno ao quarto, ao entrar percebo um argentino tentando concertar o aquecedor, deito na cama e Rafael Lindoso continua lendo alguma coisa sobre Dinossauros. O Argentino diz que não tem como concertar, maravilha, o albergue está lotado e agente não tem como mudar de quarto. A Mayra sai do banheiro e pergunta:
- Ta sentindo alguma coisa?
- Nada não.
Eu estava sentindo apenas uma dor muito grande dentro do meu pulmão todas as vezes que eu respirava; “que porra é essa?” eu pensei. Ronny retorna do ping-pong junto com Flavinha, nessa noite todos se preparam para conhecer a noite em Neuquém. Mais eu estava com um pressentimento que a noite não seria uma das melhores. Todos começam a se arrumar e eu continuo deitado, sentindo muito frio nas pernas e muita dor ao respirar.
- Emílio tu ta sentindo alguma coisa?
- Nada não.
Até que eu tento me levantar para tomar um banho, foi quando eu senti uma dor muito forte no pulmão outra vez; “puta que pariu, agora fudeu”. Deito na cama e olho para o teto, “não pode ficar pior do que já estar, certo?” Ronny e Flavinha já estão arrumados:
- Ei louco tu não vai não?
- Cara, acho que não.
- Por que?
- Eu acho que não to legal.
Depois que eu relatei o que eu sentia, todos viram que era melhor eu ficar, Mayra ficou comigo, alguns minutos depois, umas argentinas chegaram no albergue quando eu e Mayra estávamos na recepção relatando o meu estado e elas se ofereceram para me levar a um hospital. Eu aceitei. No banco traseiro daquele carro eu me senti confortável, não estava frio, o pulmão deu uma aliviada, acho que por causa da adrenalina, eu olhava as luzes passando, pessoas com traços no rosto diferente das pessoas da minha terra, mendigos bem agasalhados com roupas da Nike, “estranho isso”. O carro para e eu estou diante de um Hospital todo em mármore branco gelo, sou conduzido a uma sala onde parecia ser uma sala de espera, as pessoas que me deram carona falam em espanhol com uma mulher que parecia ser uma atendente, e eu fico ali sentado em um banco de madeira esperando, a mulher que me deu carona vai até mim e me diz que eles irão me chamar em alguns minutos, era só esperar agora; “não pode ficar pior do que já estar, certo? Afinal eu estou em um hospital” o tempo passa, e Mayra esta do meu lado e uma velha senhora argentina toda enrugada me chama atenção, seu semblante era de uma mulher que sofreu a vida inteira, “cara, a maior parte dos nordestino sobre no calor, e esse povo aqui sobre no frio, qual será o pior?” no meio dos meus pensamentos Mayra me chama:
- Emílio é tu, estão te chamando.
Eu me apresento e fico de pé ao lado da atendente, é quando chega um enfermeiro com uma cadeira de rodas e pede pra eu sentar.
- Eu estou bem. Posso ir andando.
- Não senhor, é o procedimento do hospital. Pacientes não podem andar dentro do hospital.
Eu sentei na cadeira e no início não gostei, da uma sensação de impotência, porra eu podia andar que procedimento é esse? O enfermeiro começa e subir alguns andares e Mayra não pôde ir comigo, procedimentos! O enfermeiro me coloca em uma maca em uma sala onde estão outros pacientes em outras macas, cada maca era coberta por um lençol branco em forma de curtina, eu sabia que tinha gente nas macas mais não conseguia ver o rosto de ninguém e eu fiquei ali sentado na maca, esperando. Só depois de um tempo eu percebi uma coisa que me chamou atenção, o local que eu estava tinha som, tocava tango argentino. “que porra é essa?” era um ambiente estranho e mais estranho ainda quando eu deitado na maca e percebo passar pessoas de branco com máscaras no rosto de um lado para o outro, eu só enxergava por entre as brechas do lençol que envolvia minha maca, mais com um detalhe, as pessoas que passavam de um lado para o outro, pareciam médicos e enfermeiros, com um detalhe, todos estavam ensangüentados. “Não pode ficar pior do que já estar, certo?” ficou, eu escuto gritos agonizantes e fico de espreita na brecha do lençol e vejo um cara gritando com a mão e parte do braço cheio de sangue e um dedo decepado, o cara gritava, os médicos corriam sujos de sangue, os pacientes nas macas ao meu lado imóveis e tocava tango. O médico finalmente chega, abri as curtinas e me examina. Disse que eu tinha princípio de “neumonia” que para o português significa, pneumonia, fechas as curtinhas e desaparece. Depois de algum tempo uma enfermeira abri as cortinas da minha maca e me da um aparelha para colocar no nariz. Eu recebo nebulização durante 50 minutos e vejo por entre as frestas da minha cortina, pacientes entrarem agonizando, ensangüentados, uma velha com uma perna muito enxada, um com um corte na cabeça muito profundo e tocando tango. “Que porra é essa? Parece que eu estou em um filme daqueles terrir, terror e comédia” me lembrei dos filmes trash que passava na TV bandeirantes e pensei se a moda pegasse no Brasil, em Salvador, qual seria a música dos pronto Socorros? “Segura o Tchan”? E em Belém? “quem vai querer a minha piriquita?”, depois da nebulização melhorou a dor que eu sentia no peito, os médicos me deram os remédios e eu comecei a me preocupar; “como é que eu vou pagar esse hospital?” o enfermeiro surge e me leva de volta até Mayra, e nessa hora eu pergunto a recepcionista:
- Quanto é que foi tudo?
- Aqui é um hospital público jovem.
- A ta, obrigado.
Voltamos para o albergue, dentro do quarto Rafael continua lendo alguma coisa sobre Dinossauros e me pergunta:
- E ai rapaz, o que deu lá?
- Eu to com um princípio de pneumonia.
Silêncio no quarto, e Rafael meio que sem jeito me pergunta:
- Isso é contagioso?

domingo, 14 de novembro de 2010

Enseada dos Desesperados


Somente por duas vezes, pesquisadores ou alunos com fins científicos pisaram seus pés nesse local da foto acima. Eu tive o privilégio de participar nas duas ocasiões, acho que todo estudante de biologia ou das ciências naturais que trabalha no campo sempre tem o desejo de pisar em territórios nunca explorados antes pela ciência. Quando chegamos a lugares como esse da foto, não tem como, não pensar nas grandes expedições que entraram para a história da ciência como a do Alfred Wegener que foi o primeiro pesquisador a propor a teoria da deriva continental, em busca de encontrar a prova de sua teoria navegou para o pólo norte e ninguém nunca mais viu seu corpo outra vez. Alfred Russel Wallace que viajou por diversas partes do mundo e em 1958 chegou às mesmas conclusões de Charles Darwin a respeito da evolução das espécies. Darwin que sem dúvida possui a expedição mais conhecida do mundo da ciência. Eu não tenho nenhuma expedição em um nível mundial, mais aposto que tanto Wegener, Wallace, Darwin e eu, assim como quem chega num local nunca explorado antes, sente a mesma sensação. Em uma das viagens que fiz a Ilha do Cajual eu fiz a seguinte pergunta para meu professor de Paleontologia chamado Manoel Alfredo.


- Manoel, existe algum ponto na ilha nunca explorado até agora?
- Sim, a parte sul da ilha nunca foi explorada. Não tem como chegar la, eu já tentei uma vez mais antes de chegar no sul da ilha tem uma enseada que inunda rapidamente, se não sair rápido a maré cobre tudo muito rápido.
- hum.


Acontece que em uma das viagens para esta ilha, eu e meu amigo Fábio Beluga decidimos tentar alcançar a parte sul da ilha, terminada a aula prática, eu, Fábio e Andersom começamos a nos afastar do grupo e Manoel Alfredo pergunta:


- Aonde vocês vão?
- Vamos chegar à parte Sul da ilha.
- Olha, é perigoso.
- Tranquilo.


Começamos a andar e em pouco tempo percebemos que todo o grupo que tinha viajado para a ilha para assistir a uma aula prática de Paleontologia estava nos acompanhando, horas de caminhada depois chegamos à enseada. Estava completamente inundada, dava pra se ver as rochas bem distantes e um braço de mar enorme na nossa frente, eu pergunto a Manoel:


- É ali?
- É. Está vendo o tamanho da enseada? Uma vez eu e um grupo tentamos atravessar quando a maré estava baixa, quando estávamos pra chegar do outro lado, a maré começou a subir, foi um desespero, começamos a correr e chegamos aqui com água no peito já, se tivéssemos ficado mais 5 minutos a maré teria levado todo mundo.
- Certo.


Voltamos para as barracas que estavam armadas na praia e no dia seguinte fomos embora da ilha. Seis meses depois, uma nova viagem para a Ilha do Cajual estava programada, e as vésperas da viagem, em uma Sexta-feira, eu juntamente com os estagiários de Paleontologia, estávamos no bar Papagaio Amarelo no Reviver em São Luís. Todos conversam, contavam piadas, risos. Ronny Barros percebe que eu estava bem sério na mesa.


- O que tu tem pô?
- Eu vou chegar à parte Sul da Ilha do Cajual.
- Tu já ta bêbedo? Tu não viu o tamanho daquela enseada naquele dia?
- Eu vou chegar à parte Sul da Ilha do Cajual.
- Tu vai com quem louco?
- Sozinho. Se alguém quiser me acompanhar...
- Louco, como tu vai atravessar a enseada?
- Nadando.
- Caralho, deixa de ser louco. Tu ta querendo é morrer?
- Eu vou chegar à parte Sul da Ilha do Cajual. Tu quer ir Rafael?
- Na hora.
Nessa hora, Rafael Lindoso entra na conversa e pergunta para Ronny:
- Tu sabes nadar Ronny?
- Sei caralho, mais não tem como atravessar ali a nado não louco.
- Ronny, deixa que eu compro uma bóia de patinho pra ti que vende la na entrada do Cohatrac.


Partimos mais uma vez para aquela Ilha inóspita, é Sábado, e o grupo de estudantes vai assistir a uma aula prática de Paleontologia, eu fico no acampamento e junto lenhas, ascendo a fogueira, a noite se aproxima e o grupo retorna. Já está escuro e as meninas se preparam para tomar banho em um córrego perto, os homens esperam elas terminarem para depois fazerem a mesma coisa. Horas depois, jantar a luz da fogueira, bebidas começar a surgi no meio do grupo, um violão toca músicas que todos conhecem e mais uma vez a Ilha do Cajual é palco de uma confraternização de pessoas que gostam de estar ali em contato com a natureza, em um lugar sem energia elétrica, sem água potável, sem pessoas, sem nada...apenas a fogueira no meio do grupo, álcool na garganta da maioria, as ondas do mar indo e voltando, a mata escura no fundo e o céu escuro sem estrelas carregado de nuvens. De madrugada todos estão nas barracas e eu acerto meu relógio para despertar as 5:45 da manhã. O relógio toca, eu abro os olhos, abro a barraca e vejo o céu alaranjado no horizonte e penso que em poucos minutos o sol vai surge e fazer mais um espetáculo gratuito em que a maioria do seu público dorme, a brisa de manha cedo é fria. Eu saio da barraca e abro um pacote de biscoitos nikito junto com Taff – man, coloco minha Camelbak nas costas e vou pra a barraca onde Ronny dormia.


- Levanta porra, vamos.


Faço a mesma coisa na barraca do Rafael Lindoso, ninguém vê nossa saída, não teve despedidas, muitos menos boa sorte. O acontecesse só seria descoberto se alguém de nós sobrevivesse para contar a história. E partimos... Três horas e meia de caminhada depois chegamos à enseada, a maré estava vazando. Eu olhei para Ronny e Rafael e falei:


- Vamos la galera. Vamos atravessar essa porra.


Começamos andar e a água estava na nossa canela, mais o solo não era firme, era uma enseada formada de lama, então em várias partes atolávamos mais continuávamos andando até chegar às rochas do Sul da Ilha, eu tinha feito os cálculos um dia antes, e percebi que se entrássemos na enseada com a maré vazando, e se gastássemos 30 minutos para atravessá-la e 30 minutos para voltar, teríamos 30 minutos para explorar as rochas do Sul da Ilha, pois a maré faz uma pausa de 1h para voltar a subir ou descer, e foi o que aconteceu, Eu juntamente com meus amigos Ronny Barros e Rafael Lindoso colocamos os pés nas rochas que nunca tinham sido exploradas, e para nossa surpresa, encontramos um tronco de árvore inteiro de quase um metro fossilizado, aquilo daria uma dissertação de mestrado ou uma tese de doutorado, resolvemos deixá-lo em um ponto específico de la, pois era muito pesado para ser carregado.


- Agora que agente sabe como chegar aqui, voltamos com um grupo maior e mais preparado para levar esse troco.
- Beleza.


Retornamos e ao atravessarmos a enseada, olhamos para trás e vimos o mar cobrindo tudo outra vez, durante a caminhada de volta o céu ficou bastante carregado e começa a chover, parecia uma purificação pelo nosso feito e nessa hora eu desabafei as gritos com a ilha:


- E AGORA PORRA? O QUE TU VAI FAZER?
- Emílio tu ta ficando doido?
- FALA ILHA MALDITA, É SÓ ISSO QUE TU TEM ? MERDA!!!
Nessa hora todos nos ouvimos um estrondo de um trovão e o Ronny e o Rafael levam um susto.
- Cala essa boca porra, tu ta ficando doido.
- Ei pô, não brinca com coisa séria.
- GRITA ILHA MALDITA, CARALHO, PORRA, AGENTE CONSEGUIU MERDA, TU PENSA QUE EU TENHO MEDO DE TI?


Mais trovões e chuva, chegamos encharcados, todos estão protegidos em baixo de uma falésia e quando o grupo nos avista surge a clássica pergunta.


- Onde diabo vocês foram?

sábado, 6 de novembro de 2010

Uma noite alucinante 2




No reino animal, a estratégia que cada animal utiliza para sobreviver é o que faz a diferença entre a sua vida ou a sua morte, nos répteis existe em geral duas formas de encontrar suas presas, ou o animal utiliza o método chamado “Senta-espera” ou o método da “procura-ativa”. No método senta-espera, ele simplesmente se posiciona em um local e espera a presa atravessar seu caminho para dar o bote certeiro, já no método da procura-ativa, o animal procura a sua presa por todo o território demarcado por ele ou fora dele. O método senta-espera inspirou pesquisadores no mundo inteiro a desenvolver suas metodologias científicas, pois hoje esse método é utilizado, não para caçar animais com objetivo de saciar a fome de pesquisadores, mais para fotografar determinados animais. O pesquisador fica camuflado em um determinado ponto com uma máquina fotográfica em mãos e põe uma isca para atrair determinado animal para ser fotografado, é uma técnica bem primitiva é verdade, mais utilizada para quem tem paciência e gostar de ficar horas no meio do mato parado esperando o animal aparecer para comer a isca. Quem tem um pouco mais de dinheiro compra máquinas fotográficas que possui sensores, e tão logo um animal passa por um ponto a máquina dispara automaticamente. Certo dia, na Universidade Federal do Maranhão em São Luís, cinco alunos do curso de Ciências Biológicas decidem aplicar um método senta-espera em uma ilha próxima ao município de Raposa.
- Ei, Babu vamos para Curupu no próximo fim de semana?
- Na hora, quem vai tanto?
- Eu, Mikail, Bento e Fernando. Mais agente vai tentar fotografar algum bicho grande que tem la.
- Que bicho?
- Cara eu não sei, eu e o Fernando fotografamos umas pegadas grandes na última vez que fomos la, vamos ver agora se conseguimos fotografar o bicho.
- Como vai ser isso?
- Os moleques ficaram de levar a carne que agente vai usar como isca, agente vai se esconder no mato e esperar.
- Beleza.
Terminal rodoviário Cohab-Cohatrac, de manha cedo os cinco futuros biólogos se encontram e para a surpresa de todos o Fernando vem com uma cara de cachorro com fome e fala:
- Bicho, não deu pra compra a carne não.
- Porra tu é muito fulero mermo! (exclama Tayllon, conhecido como “Babu” que depois dessa noite ele passou a ser conhecido com outro nome)
- Ei pô , relaxa, agente compra a carne la na raposa.
Os cincos jovens entram no ônibus com suas mochilas, ou melhor, quatro jovens entram no ônibus com mochilas, Bento levou uma bolsa de alça, daquelas que fica de lado quando carregamos. Chegamos ao porto da Raposa, cheiro de salitre e peixe no ar. O sol frio e a brisa leve faz do lugar um dia perfeito, com a maré calma os maçaricos junto com graças, levantam vôo e forma uma vista digna de uma foto para um quadro na parede da sala. Não encontramos carne, mais sim, restos de uma ossada, perfeito. Acertamos o preço da atravessia com um canoeiro e partimos para a Ilha de Curupu. A caminhada começa, subindo e descendo dunas, de um lado da pra se ver a imensidão do oceano do topo de uma duna e do outro um manguezal imponente e cheio de vida e matéria em decomposição, quatro jovens de mochila e Bento arrebenta uma das alças de sua bolsa, ele agora anda com ela mais parecendo uma mãe com seu filho, Benta anda com sua bolsa abraçada a ela, que na volta ele a arrasta a coitada no chão, parecendo um retirante que perdeu tudo em uma enxurrada. Paramos em cima de uma duna bem alta e olhamos para o interior da ilha, Restinga no começo e muito mangue no restante. Atravessamos a Restinga e deixamos nossas coisas na beira do mangue, almoçamos e ficamos la deitado jogando conversa fora, depois de um amanha inteira debaixo do Sol subindo e descendo duna, deitar na beira de um manguezal frio é mais do que merecido.
- Vamos entra no mangue? Ver se observamos algo de novo com os macacos que ficam la?
- Vamos.
Depois de ficarmos a tarde no meio da lama voltamos para o ponto que iríamos esperar, armamos as barracas a certa distância e escolhemos pontos diferentes para ficarmos na espreita, cada um pegou o precisava (comida, água e etc)a isca foi posicionada em cima de um tronco seco para atrair algum animal e o silêncio reinou absoluto. Os grupos ficaram divididos em, Babu,Fernando e Mikhail em um ponto e eu e Bento em outro. Nada indicava que ia chover, mais a brisa que vinha do mar começou a ficar cada vez mais forte, fazendo as árvores e arbustos movimentarem bastante. O céu começou a ficar carregado de nuvens, e relâmpagos começaram aparecer com muita freqüência, depois do vento, nuvens e relâmpagos, trovões começaram a ser ouvidos distante. Nessa hora eu percebi o tanto que Biólogo de campo é louco. Enquanto quase 1 milhão de pessoas em São Luís estava agora protegidas no conforto de suas casas, algumas assistindo TV, outras teclando no MSN, outras lendo algum blog... Cincos jovens estavam em silêncio, na beira de um manguezal escondido atrás de arbustos com máquinas fotográficas na mão a espera de algum animal selvagem daquela ilha. Em poucos minutos vai cair um temporal, e agente ali no meio do mato, nesse momento em que eu pensava nessas coisas eu senti algo bem gelado na minha cocha, eu levei um susto e sacudi minha perna. Eu não sabia o que era, e perguntei:
- Que diabos foi isso tu viu?
- Relaxa pô era uma rã nada demais...
- Puta que pariu...
Deu pra perceber que o outro grupo falava bem baixo, mais não sabíamos o que era (eu soube depois que estavam sorrindo, achando que tinha sido o Bento que levou o susto) foi quando os primeiro pingos gelados tocam nossos rostos e resolvemos ir para as barracas (eram duas). Bento e Fernando ficaram em uma e eu, Mikhail e Babu na outra barraca. Dentro da barraca dava pra se ouvir o estrondo dos trovões e várias vezes uns clarões de relâmpagos, a cada relâmpago apareciam sombras de galhos na lona da barraca e os pingos da tempestade escorriam em volta da gente, estávamos sujos e com frio, deitados em uma barraca sem colchão no meio do mato debaixo de uma tempestade sem comunicação alguma com outras pessoas. Ate que a Tempestade ficou bem fraca de madrugada, mais continuaram os relâmpagos e trovões, foi quando eu percebo algo do lado de fora da barraca, algo caminhava e eu não tinha a menor noção do que era. Eu ouço as passadas e fico em alerta, estava no meio da barraca, Babu estava de lado, encostado na lateral da barraca e Mikhail do outro, no meio de clarões, trovões e algo caminhando do lado de fora da barraca nosso colega Babu da um pulo altamente esparroso:
- Puta merda, alguma coisa me cheirou aqui!!!
- O que?
- Alguma coisa veio aqui no canto da barraca e me cheirou perto da minha cabeça.
O silêncio toma conta da barraca, nessa hora somente pingos fracos, muito vento la fora e vários clarões no céu ao som de trovões bem distantes.
- Rapaz deve ter sido um Guaxinim.
- Emílio cadê tua faca? Cadê tua faca pô? Me da tua faca ai!!!
Mikhail com toda a sua calma de bom samaritano tenta acalmar nosso colega que estava em desespero:
- Relaxa Babu, foi só um Guaxinim.
- Que porra de Guaximin, me da a faca ai Emílio, eu quero dormi com a faca na mão.
- Peraí pô, eu vou pegar aqui. Vou colocar aqui do canto, qualquer coisa agente pega.
- Eu não vou dormi aqui no lado da barraca não.
- Então vem aqui pro meio pô, eu duro ai.
Amanhece o dia....
- kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk ( eu e Mikhail)
Bento se aproxima confuso e sem entender e pergunta o que estava acontecendo:
- Um Guaxinim cheirou o cangote de Babu e se apaixonou por ele!
- kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk (eu, Mikhail e Bento)
- Esses caras são foda , rsrsr (Babu)
- Que história é essa de Guaxinim Babu?
- Não vem também não Fernando.
Nessa hora eu não me contive e falei:
- Relaxa Guaxinim, isso acontece nas melhores famílias.
E foi assim que o nosso colega Raymony Tayllon, conhecido como Babu adquiriu mais um pseudo-nome:Guaxinim.